Hora da genética!
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Acredita-se que os vírus são prejudiciais aos humanos, nos deixam doentes e podem matar, algo que se intensificou com o curso da pandemia do SARS-Cov-2. Mas, também é sabido que temos muito pouco entendimento sobre eles. Os vírus são um grupo de entidades ainda mal definidas, sem uma origem aparente na classificação das espécies na árvore da vida e dentre as possíveis teorias, alguns cientistas têm acreditam que os vírus, sendo entidades bioquímicas patogênicas compostas por apenas dois elementos: ácido nucléico (DNA ou RNA) e uma camada proteica na superfície, também conhecida como capsídeo, são entidades muito mais simples do que algumas bactérias ou arqueas, portanto sua origem pode ser ainda mais antiga do que esses seres com maior complexidade. Outro grupo de cientistas afirmam que os vírus eram entidades tão complexas quanto algumas bactérias, mas em algum momento de sua evolução, eles criaram uma simbiose com algum outro organismo, que com o tempo tornou-se parasita, o que fez com que eles fossem cada vez mais dependentes dos hospedeiros, gerando assim um retrocesso em sua evolução e perdendo complexidade. Existe também um grande debate sobre se deveriam ser classificados como seres vivos ou não. Muitos cientistas consideram que por não terem as funções necessárias para serem classificados como seres vivos, tais como: produzir sua própria energia ou ser capaz de manter seu ambiente interno, eles não podem ter uma definição exata, deixando-os em um limbo entre o vivo e o não-vivo. A paleovirologia, surgiu como o estudo dos vírus que existiram no passado ou os já extintos, pelo que os paleovirologistas se deparam com a tarefa de estudar a origem desses seres constituídos de material genético. O grande problema que encontraram foi que a princípio os vírus não deixam vestígios visíveis nas rochas como certos insetos ou mesmo mamíferos, ou seja, não deixam fósseis físicos e a possibilidade de encontrá-los é muito pequena, pois sendo material genético são muito frágeis e degradam-se rapidamente ao longo do tempo. Assim, os primeiros paleovirologistas tiveram que recuar e começar a procurar em outros lugares alguns vestígios de vírus antigos. No ciclo normal dos vírus, ao infectar um hospedeiro, ele pode entrar nas células e depositar seu próprio material genético, e ao inseri-lo no material genético da célula, pode gerar cópias de si mesmo e infectar outras células. A chave começar o estudo da origem dos vírus estava oculta no ciclo viral, pois às vezes, quando os vírus infectam as células germinativas, esse material genético é transmitido de forma hereditária, de geração em geração. Portanto, os vírus que infectaram nossos ancestrais poderiam ser transmitidos entre gerações, gerando assim um registro oculto da exposição de nossa espécie a diferentes tipos de vírus ao longo da história. O mais interessante é que os cientistas conseguiram determinar que aproximadamente 8% do nosso DNA total contém parte de genes virais ancestrais, que foram chamados pelos pesquisadores de retrovírus endógenos.
O que são os retrovírus endógenos? Os retrovírus endógenos (ERVs) são partes de DNA de infecções ancestrais que tiveram sua origem em retrovírus exógenos ao longo do tempo, e que conseguiram se inserir no genoma e serem herdados entre as gerações. Isso acontece quando um vírus infecta as células de um hospedeiro, a fita do RNA do vírus é convertida em DNA pela enzima transcriptase reversa. Ao infectar também as células germinativas, pode haver transmissão vertical por herança mendeliana. Os ERVs estão presentes em muitas espécies, incluindo mamíferos, e normalmente, são considerados geneticamente defeituosos pelo que podem ser suprimidos facilmente pelo corpo, mas em outras ocasiões podem ser expressos e replicados no indivíduo. Os retrovírus endógenos humanos (HERVs) foram descritos pela primeira vez na década de 1960, e são classificados em 22 famílias de acordo com sua sequência genômica, sendo que sua nomenclatura geralmente se refere à primeira letra do aminoácido do RNA transportador do sítio de ligação que inicia a transcrição reversa nesse vírus. Mas esse material genético viral é ruim ou pode nos afetar de alguma forma? A maioria dos HERVs reside no genoma humano como LTRs (Long Term Repeats) isolados, passando a ser considerados como genes lixo, devido à recombinação homóloga entre duas regiões franqueadoras 5' e 3', razão pela qual permanecem silenciados pela intensa metilação do DNA. Por outro lado, alguns genes podem chegar a serem expressos, gerando assim benefícios e malefícios para o ser humano. Alguns dos benefícios dos retrovírus endógenos humanos são que eles auxiliam na implantação do embrião através da produção de glicoproteínas Sincitina-1. A sincitina tem a capacidade de induzir a formação de sincício (células polinucleares resultantes da fusão celular), que são abundantemente expressas na placenta durante a gravidez. Nas fases iniciais da gestação, o citotrofoblasto desempenha um papel importante no desenvolvimento fetal e placentário, essas células proliferam e invadem o endométrio para formar as vilosidades que servirão para ancorar o embrião e a placenta. A sincitina auxilia, por sua vez, na diferenciação e fusão dos citotrofoblastos em células multinucleadas denominadas sinciciotrofoblastos, sendo o primeiro canal de comunicação materno-fetal, que posteriormente servirá para a formação da placenta. Outra propriedade importante da sincitina é sua capacidade imunossupressora, que serve para modular o sistema imunológico da mãe, de modo que o embrião não é reconhecido como antígeno exógeno e não é descartado, causando um aborto. Além disso, os HERVs são de grande importância na variabilidade genética, podem auxiliar na proteção contra superinfecções por retrovírus e como splicing alternativo. Mas, também existem estudos que mostram que alguns HERVs podem estar relacionados a diversas patologias, como doenças genéticas, vários tipos de câncer, doenças autoimunes e neurológicas. Por exemplo, um gene localizado na porção do braço curto do cromossomo 7, segundo os pesquisadores, mostrou ter uma sequência HERV que codifica proteínas do envelope viral, e sua ativação está associada à atividade imunológica aumentada, principalmente em tumores de ovário e próstata. Os HERVs do grupo 3, denominados ERV3-1, localizam-se na porção 11.21 do braço longo do cromossomo 7 e codificam uma proteína semelhante à poliproteína Env. O problema ocorre quando há uma superexpressão dessa proteína anômala, pois estudos demonstraram que, está presente em alguns tecidos tumorais, principalmente no câncer colorretal e em vários subtipos de adenocarcinoma. Alguns tipos de HERV-K também foram detectados em células tumorais, em algumas doenças neurológicas e psiquiátricas. Outros HERVs através da hipermetilação podem estar causando, segundo alguns estúdios, o neuroblastoma, considerado o tumor sólido mais comum e de grande letalidade em crianças. Outros estudos, encontraram que os HERVs da família W poderiam desempenhar um papel na patogênese da esclerose múltipla (EM) uma doença autoimune desmielinizante e inflamatória que causa incapacidade neurológica irreversível. Assim, são vários os exemplos de benefícios e malefícios que o DNA viral ancestral que carregamos dentro do nosso DNA pode trazer à nossa saúde. É importante, portanto, dar destaque ao estudo dos vírus e a relação que eles podem ter com a evolução do ser humano e de outras espécies. O estudo da genética pode auxiliar muito no nosso entendimento dos vírus, para compreender por que nos adoecem, de onde vêm, o que fazem pela nossa saúde e, mais importante, como podem ajudar no futuro a criar medicamentos, apoiar no desenvolvimento da engenharia genética e na produção de novos tratamentos genéticos e imunológicos para o tratamento do câncer etc. Catherine Molina Discente de Medicina da UNILA Referências: - WESSNER, D. R. Origin of Viruses. Learn Science at Scitable. Disponível em: https://www.nature.com/scitable/topicpage/the-origins-of-viruses-14398218 - DURZYŃSKA, J.; GOŹDZICKA-JÓZEFIAK, A. Viruses and cells intertwined since the dawn of evolution. Virology Journal, v. 12, n. 1, 16 out. 2015. DOI: 10.1186/s12985-015-0400-7 - HOLMES, E. C. What Does Virus Evolution Tell Us about Virus Origins? 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AutorEscreva algo sobre si mesmo. Não precisa ser extravagante, apenas uma visão geral. Histórico
Maio 2022
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